“Como está seu sentimento para esse filme?”, me perguntou meu amigo Marcel, quando eu cheguei na cabine de imprensa de Thunderbolts*, a convite da Disney.
“Curioso, mas não empolgado”, eu respondi.
“Sabe que eu tô empolgado pra esse?”, disse ele e eu compreendo. Caiu nesse filme meio despretensioso uma responsabilidade abusada, de fazer o público nerd se empolgar de novo com a MCU, depois de um grande vilão bagunçado que não colou, uns filmes bem bostas, outros filmes mais mornos… Era uma responsabilidade grande demais para o grupo de desajustados que o estrelariam.
Anti-heróis
Com exceção do Soldado Invernal, que já cumpriu sua redenção redondinha na fase de ouro da Marvel, nenhum dos personagens de Thunderbolts* é um herói de verdade. Eles são egoístas, alguns buscam a fama, outros têm métodos de ação contestáveis. Longe do bom-mocismo cafona que a gente tanto gosta.
A solução foi focar principalmente em um personagem do qual todos os outros orbitam. Ousado para um filme que se propõem a apresentar um grupo de heróis, funcionou muito bem, graças ao carisma de Florence Pugh, por quem torcemos desde o começo, com suas missões não tão honráveis.
Se ela brilha, os personagens ao seu redor não ficam atrás. Um time com tanta gente também ia necessitar de grandes introduções; mas como é MCU, todo mundo já apareceu em um lugar ou outro, seja séries que ninguém assistiu, ou filmes que ninguém se lembra. Não foi problema: às vezes uma ou duas frases no meio de um diálogo já são o suficiente para dizer quem é aquela pessoa e porque ela é detestável. Sim, o roteiro de Thunderbolts* é surpreendentemente bom.
A Marvel quer ser A24
Não é só um roteiro redondinho, mas é uma produção… digamos… contida.
É parte dos esforços da Marvel para readquirir seu glamour de outrora. Ao invés de escalar mais e mais, com ameaças globais ou universais, Thunderbolts* se confina em pequenos espaços: as excelentes cenas de ação ocorrem em salas fechadas, sem precisar derrubar prédios ou destruir cidades. A batalha final ocorre no menor espaço possível, no clímax mais contido que um filme da Marvel já tentou fazer.
Diminuir o escopo traz alma para o filme. Ele até toma tempo para fazer uma metáfora óbvia, mas legal, sobre problemas mentais.
Essa regressão em grandiosidade fica óbvia quando a própria campanha de marketing do filme direciona para compará-lo de forma bem óbvia com a A24, a micro-empresa cinematográfica que virou queridinha dos nerdolas do Letterboxd. É a Marvel, um estúdio gigantesco, responsável pela maior bilheteria de todos os tempos tentando ser uma diminuta distribuidora de nicho, evidenciando que seus grandes talentos também podem fazer filmes artísticos.
Bom demais para ser verdade
Sim, é.
“Eu não tinha expectativas, mas eu adorei”, eu disse pra Marcel, enquanto subiam os créditos. “Eu tinha e adorei também”, respondeu ele.
Thunderbolts* foi o primeiro filme da Marvel pós-pandemia lançado sem grandes problemas de bastidores, sem regravações constantes. Tudo parece ter dado certo.
Há até uma auto-crítica no meio do filme, onde personagens admitem uns aos outros que não há mais heróis confiáveis no MCU deles. Parte da graça é que é verdade.
As coreografias de luta estão muito boas, a ação é pontuada em momentos esporádicos, dando tempo para os personagens serem trabalhados. O filme tem uma comédia leve, mas muito boa. O Guardião Vermelho de David Harbour brilha demais, e a gente termina gostando até do Agente Americano, o Capitão América de John Walker.
Thunderbolts* (a essa altura você já deve ter percebido que o asterisco é importante) é um respiro de alívio para os fãs de filmes de hominho fantasiado dando soquinho. Ótimo para quem estava com saudades de sair empolgado de uma sala de cinema. Deu para sair aliviado agora também.
Tem cena pós crédito?
Tem, claro… é filme da Marvel.
Só que dessa vez, a cena é bem legal – e, talvez importante, não só para a própria história dentro do filme, mas também para o MCU como um todo.
Vale a pena ficar até o final, não é só um ator musculoso de uma série adolescente da Paramount+ encontrando um gato gosmento em CGI e dizendo “Abluha, parece que agora o Universo vai virar bola de pêlo“, como a Marvel insistia em fazer nos últimos anos.
Muito bom quando uma empresa aprende com seus erros.