Eu sempre enfatizei sobre uma das maiores facilidades de se contar uma história durante a Segunda Guerra: o maniqueísmo. O nazismo, como detentor de todos os males da época (título que eles fizeram por merecer), já começa como um grande vilão a ser combatido desde o minuto zero de filme. Essa é, comparativamente, a dificuldade de se contar histórias da Primeira Grande Guerra, a qual não há um inimigo óbvio.
O filme alemão Stella traz essas camadas de cinza para a Segunda Guerra. Os mais desavisados podem já inferir que “claro, o filme é alemão, eles vão querer mesmo levantar dúvidas em relação aos vilões da guerra que eles perderam“, mas os nazistas estão lá e ainda são os grandes vilões. A diferença é o lado da protagonista mesmo.
Protagonista contestável
É a história real de Stella, uma judia que começa a colaborar com os nazistas entregando outros judeus. Não que ela queira, virou a casaca, tá jogando com o adversário. Ela foi lentamente sendo coagida a isso, por ter sua família ameaçada por eles.
É claro que isso não justifica suas atitudes, e o filme deixa isso claro. A certa altura é natural e coerente que tenhamos raiva da protagonista, um certo asco por suas ações. Nesse ponto, o filme é um tremendo acerto. Eu, particularmente, adoro protagonistas contestáveis; e a idéia de que a pessoa tem mais tons de cinza do que o filme comum da Marvel tenta nos induzir a acreditar vai de encontro com a natureza humana.
Mas vale?
Não sei dizer. Tecnicamente, o filme não comete erros crassos. Para um ex-morador de Berlim, é sempre uma delícia ver a cidade nas telas (“olha! eles filmaram na Nordbahnhof!!“), mas a película tem uma direção estranha. As transições de cenas me causaram um desconforto tão grande que eu chego a cogitar se não foi algo proposital.
Como um fã de cinema alemão, para mim valeu. Como um fã de Lindy Hop e esse estilo musical dos anos 1920, valeu de novo. Como fã da Segunda Guerra e de personagens complexos também.
Mas eu entendo que o enredo pode ficar confuso e, eventualmente, as decisões técnicas parecem equivocadas. Então acho que vale, mas com ressalvas.
Ainda mais tons de cinza é o que este filme conseguiu.