SALADA CAPRESE I see dead people

Mauricio de Sousa, o filme

Durante décadas, o quadrinista Mauricio de Sousa encantou o Brasil com as suas histórias. Poucos brasileiros, nascidos depois da década de 60, não foram impactados com os personagens da Turma da Mônica. Muitos foram alfabetizados lendo esses gibis. Agora, quando o criador dos personagens do Limoeiro está prestes a completar 90 anos de idade, é a sua história de vida que vai para as telonas em Mauricio de Sousa, o filme, a partir do dia 23 de outubro. E o resultado é surpreendente. 

E são muitas as surpresas. A primeira e principal está no modo como a vida de Mauricio é contada. O filme fica no meio do caminho entre uma cinebiografia tradicional e uma comédia romântica. E o amor que move o nosso protagonista, aqui, não é, necessariamente, o romance com uma mulher – embora ele também seja parte da trama. O amor que move o personagem principal é para realizar o maior sonho de sua vida, cultivado desde a mais tenra infância e repetido várias vezes no filme: conseguir viver dos seus desenhos. 

Claro, o nosso herói passa por muitas dificuldades até ser bem sucedido. Alguns tentam desestimulá-lo dizendo que ele não teria futuro sendo desenhista. Lá pelas tantas, ele é até vítima de uma espécie de cancelamento, bem antes disso ser modinha. O que poderia facilmente virar um dramalhão, ganha uma abordagem leve, muitas vezes bem-humorada. Os diálogos são ágeis, espertos. E o filme, que é narrado em primeira pessoa – pelo Mauricio criança e depois pelo adulto – nunca perde o ritmo. 

Durante a entrevista coletiva de lançamento, que o Salada Caprese esteve presente, o diretor Pedro Vasconcelos deixou claro que o filme era uma homenagem ao quadrinista. Nem poderia ser diferente, poderia dizer um leitor mais cínico. Afinal, o longa é co-produzido pela MSP estúdios e é o seu filho Mauro que interpreta o pai. Nesse cenário, seria inimaginável pensar em uma obra com viés crítico. Mas a homenagem vai além. Vasconcelos quis que o seu filme tivesse o mesmo espírito dos quadrinhos da Turma da Mônica. Por isso, mais de 90% das cenas foram feitas com a câmera travada, justamente para emular um gibi. Em alguns momentos, até aparece um recordatório, aquelas caixas de texto que, geralmente, informam passagens de tempo nos quadrinhos. Apesar do tom de homenagem, o filme é eficiente em humanizar o seu biografado. Em uma cena especialmente hilária, vemos o quanto Mauricio é distraído. Por três vezes, o quadrinista esquece no ônibus o desenho que prometeu para um amigo. E existem outras curiosidades deliciosas. Você sabia que Mauricio de Sousa foi, durante a infância, um calouro de música de grande sucesso nas rádios do interior? Esses pequenos achados dão um sabor todo especial para a trama.

É, portanto, uma cinebiografia que tem o objetivo de celebrar o seu protagonista. E cumpre com muita competência essa intenção. Embora seja uma personalidade, com toda justiça, muito querida e quase isenta de polêmicas, o filme até teria material se quisesse uma abordagem com mais nuances. Poderia lembrar que só em 2015 as revistas da turminha passaram a creditar quem escrevia e desenhava as HQ’s. Mas isso fugiria do arco de tempo do filme, que termina a história em 1970, e do objetivo de celebrar Mauricio de Sousa que completa 90 anos no próximo dia 27 de outubro. Um lindo e justo presente para quem deu tantas alegrias para os brasileiros. 

Leitor desde sempre. Apaixonado por literatura policial, divulgação científica, quadrinhos, e quase todo o resto. Fez história e jornalismo só para ficar desempregado em duas faculdades diferentes.