SALADA CAPRESE I see dead people

Nerdcast e eu

Há anos que sou um grande fã do Nerdcast. Pelo menos desde 2011 acompanho avidamente o programa, tendo ele como meu principal meio de conexão com a cultura pop por um longo tempo de minha vida.

Não são poucas as memórias formadas com o programa. Lembro de ouvir episódios inteiros em uma viagem de ônibus entre Mostar e Sarajevo. Lembro que, em 2015, uma gerente da empresa onde eu trabalhava me deu uma advertência por estar rindo durante o trabalho. “É que eu estou ouvindo um podcast”, eu teria respondido. “Aqui não é lugar para rir, é para trabalhar”, respondeu ela, deixando claro que aquela empresa não era lugar para mim.

Não só eu gostava do conteúdo gerado por Alexandre Ottoni e Deive Pazos, mas eu nutria uma sensação de imenso respeito por eles. Por tudo o que eles alcançaram, fruto de esforço, visão, e trabalho duro.

Em 2021, a maior mudança do grupo ocorreu com a venda do conglomerado ao varejista Magalu, pelo valor não anunciado de 10 milhões de reais (informações não-oficiais). Uma promessa de ampliação e crescimento que não se concretizou. Não só isso, mas a aquisição deve ter se mostrado um péssimo negócio para os dois influencers.

Uma aquisição desse porte geralmente é paga com ativos de ações. A MGLU3 era uma das ações mais promissoras a bolsa brasileira em 2021, começando o ano com um valor de mais de R$230 por ação. É possível afirmar que a compra gerou a Alexandre e Deive algo em torno de 43000 ações – vamos colocar o número em 42000, porque é o tipo de nerdice que os dois fariam. O problema é que as ações da Magalu derreteram nesse período, estando avaliadas hoje em cerca de R$10. Com isso, a venda de uma das maiores marcas do mundo nerd pode ter rendido somente cerca de R$420.000,00. Absolutamente nada comparado à evaluation de R$14.000.000,00 que o portal tinha há cinco anos atrás.

Com certeza Alexandre e Deive não são pobres. Certamente vivem uma vida confortável e podem gastar o merecido dinheiro deles no que bem entenderem. Mas é quase certo que a venda da empresa não foi um bom negócio. É possível que esse seja o motivo pelo qual eles estão desmotivados e amargos? Sim, é. Porém, há um motivo mais forte: de força política.

De uns anos para cá, o portal que se destacava pelo seu correto ateísmo político adotou um forte viés esquerdista. Não só isso, mas eles aparentemente abandonaram colaboradores que não tivessem declarado suas opiniões políticas em 2022. O próprio Affonso Solano, colaborador de longa data do time Jovem Nerd já declarou que a guinada ideológica deles parece ter sido um problema interno sério, que ainda perdura.

E isso é uma pena enorme. Como admirador, me dói ver declarações políticas completamente burras deles. Eles chegam ao ponto de fazer a coisa mais estúpida possível que uma pessoa pode fazer na internet: defender político. O respeito que eu outrora nutria por ambos decaiu fortemente.

Um exemplo de como a falta de respeito à divergência e à opinião alheia se tornou um padrão do time do Nerdcast veio do Mau Faccio, e seu podcast (que eu também acompanhava religiosamente, o Mau Acompanhado). Eu tinha até entrado em contato com o Mau para agradecer a cobertura que eles faziam do Big Brother Brasil, que na época era essencial para um projeto de roteiro que eu estava trabalhando. Uma tarde no Twitter, me surpreendi com o Mau Faccio sendo gratuitamente agressivo com outra pessoa, simplesmente pelo fato dela ter feito uma crítica ao governo petista. Não vou entrar em detalhes, mas foi somente isso: uma crítica válida e um comentário meu ao Mau basicamente dizendo que ele não precisava ser grosseiro. Eu não fui (e nem sou) rude, mas mesmo assim, tomei um block. A mensagem de um block é direta: a pessoa não quer que eu consuma o que ela produz. Por respeito, parei de ouvir o Mau Acompanhado, que eu realmente ouvia toda semana. Alguns meses depois, o podcast acabou.

Entre outros problemas, está a forma como o editorial do Nerdbunker foi tratado. O podcast do nerdbunker era minha principal conexão com o que estava acontecendo no meio nerd. Os editores e jornalistas viraram amigos, como conseqüência de diversos encontros em cabines de imprensa. E foram todos subitamente demitidos, toda a linha editorial extinta. Problemas acontecem, e é natural que membros da alta hierarquia de empresas tenham que tomar decisões assim. O problema é o papinho: a demissão em massa ocorre enquanto Alexandre discursa como grande defensor do proletariado em um nerdplayer da mesma semana. Pega mal. Soa falso. E é um discurso burro.

Ainda sou um grande ouvinte dos Nerdcasts. Já deixou de ser meu podcast favorito há muito tempo (atualmente essa posição está com o Vortex Podcast, da excelente Katiucha Barcelos), mas o que me fez gostar dele ainda está ali no meio. Infelizmente é comum que hoje em dia eu revire os olhos com mais freqüência que dê risadas, mas ainda encontro momentos em que é possível gargalhar alto.

Espero continuar sendo um ouvinte por muito tempo. Torço por uma revitalização da marca. É uma torcida em vão: não dá para esperar que o nerdcast volte a ser o que ele já foi um dia quando os próprios criadores têm vergonha do que eles fizeram: episódios passados são retalhados, destruídos e tirados do ar, por conterem piadas com as quais eles não concordam – mesmo que piadas envelheçam mal, elas são fruto de seu tempo. Apagá-las é apagar uma história de evolução pessoal.

Em alguns aspectos, eles certamente evoluíram. Com certeza não politicamente. Isso infelizmente se reflete no Nerdcast.

Ainda não ouvi a edição especial número 1000. Percebi que se fosse esperar ouvi-la para publicar este texto, que é simultaneamente uma ode e uma crítica ao portal de cultura pop mais relevante do Brasil, talvez nunca o publicasse. Eventualmente chegarei nele.

Espero, pelo menos. Que eu continue ouvindo…

Autor:
Barão do Principado de Sealand. Com uma inexplicável paixão por cinema, cervejas e queijos.